Johnny Depp possui um fino senso de humor, sutil, elegante e muito peculiar.
Suas respostas e observações emitidas por ocasião de entrevistas, carregadas de ironia e sinceridade desconcertantes, muitas vezes são mal interpretadas ou utilizadas de forma desvirtuada por certo tipo de imprensa ou redes sociais.
Em novembro de 2011, em entrevista à revista alemã TV Movie, divulgando o filme The Rum Diary, Johnny comentou sobre o funeral do amigo Hunter Thompson, que ele patrocinou em agosto de 2005, e como desejaria que fosse seu próprio funeral, disse:
“Talvez eu pudesse ir em um barril de uísque e todos poderiam tomar um gole… Hunter sempre sonhou com uma maneira especial para ir. Ele queria ser disparado de um canhão construído pelo próprio esforço. Brilhante! Então eu construí um enorme canhão depois de sua morte em 2005, e disparei suas cinzas para o céu”.
Isto bastou para que volta e meia alguma página do Facebook ou outras mídias, coloquem a frase em discussão, como se houvesse necessidade de aprovação ou não, seguida de inúmeros comentários grotescos sobre alcoolismo.
Como estas pessoas desconhecem a instrução ampla e variada de Johnny, e seu amor pelos livros, não sabem que esta frase remete a um de seus livros preferidos, The Ginger Man – de J.P.Donleavy, publicado no Brasil com o título “Um Safado em Dublin”, pela L&PM Pocket.
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No livro, em sua página final, o personagem Sebastian Dangerfield diz:
“Quando eu morrer quero me decompor num barril de vinho do Porto e fazer com que depois seja servido em todos os bares de Dublin. Gostaria de saber se descobririam que era eu”.
Ao discorrer sobre sua coleção essencial, Johnny disse a respeito deste livro:
“As aventuras de um incorrigível Sebastian Dangerfield. Rebelde, voluntarioso e totalmente desonesto. Esta lírica, cômica maravilha foi me apresentada por Hunter. Todo homem deveria ler esse livro e gastar pelo menos uma noite de sua vida representando sem remorso este horror de um indivíduo!”.
E Johnny é tão apaixonado por este livro, que há 16 anos ele vem tentando trazê-lo para a vida, como gosta de dizer, ou seja, adaptá-lo e transformá-lo em um filme. O processo, entre idas e vindas, teve início em 1998, quando ele foi a Dublin negociar um roteiro com Donleavy, num projeto que envolvia o músico Shane Macgowan, porém sem sucesso. Em 2005, houve relatos de novas discussões e Johnny chegou a encontrar-se com Donleavy nas comemorações dos 50 anos de lançamento do livro.
Em 2006, as coisas voltaram a tomar forma, com Johnny escolhendo o diretor Laurence Dunmore (The Libertine) para a empreitada.
Com o sucesso de Piratas do Caribe e os inúmeros compromissos, o projeto perdeu força, porém, no verão de 2008 Johnny retornou à Irlanda e em 2009 Donleavy declarou estar com esperanças de que tudo desse certo e em 2011, Johnny disse à Fox News que ainda tinha toda a intenção de fazer este projeto, que este era um sonho que gostaria de realizar antes de sua aposentadoria.
Finalmente, em 03 de novembro de 2013, quando estava filmando Mortdecai em Londres, Johnny voltou à Irlanda e se encontrou novamente com J.P.Donleavy. Desta vez o encontro ocorreu em um almoço no “Weirs Bar and Restaurant”, em Multyfarnhan, um autêntico Pub Irlandês.
Johnny e a família dos proprietários do Weirs Bar and Restaurant
Isto apenas vem confirmar que o projeto continua vivo, e que talvez em breve tenhamos a oportunidade de finalmente ver este personagem ganhar vida nas telas.
Donleavy, que nasceu em Nova York no ano de 1926, mudou-se para a Irlanda depois da II Guerra Mundial e até hoje mora em uma fazenda em Levington Park, há 50 milhas de Dublin, onde continua escrevendo sempre a mão. The Ginger Man chegou a ser censurado-e banido nos EUA e na Irlanda – por ser considerado obsceno, mas hoje está na lista das 100 melhores novelas da Modern Library. O personagem principal de Donleavy, o fascinante canalha Sebastian Dangerfield, foi inspirado em um amigo americano do escritor: Gainor Stephen Crist.
The Ginger Man é o romance picaresco que faz todos pararem. Vigoroso, violento, loucamente divertido, ele é a malemolência da malandragem, uma clamorosa canção cômica sobre sexo. Um crítico na Inglaterra – onde o livro teve um sucesso surpreendente – o chamou de “uma contribuição inequívoca para o tema dos “jovens homens furiosos”“. (Dorothy Parker- em 1958 para a Revista Esquire).
Como costumamos dizer, todas as palavras e comentários de Johnny Depp têm um sentido, uma ligação, uma motivação muito além das simples palavras.
Rosa Maria.